Letras no Asfalto

Letras no Asfalto

28.11.08

Observe o vento,
sinta a música, os tambores,
as flautas de todos os que tocaram,
festejaram e combateram antes de vc.

Se entregue totalmente ou suma desta terra,
assuma seu legado ou morra para os seus,
queira o caminho, siga o caminho,
quando chegar sua vez de chamar um desgarrado, faça.

É melhor começar a pisar de forma diferente,
neste chão, seu sangue já foi derramado,
e suas cinzas já tingiram o rio que agora mata sua sede,
se prestar bem atenção no todo, poderá ouvir os mais velhos.

De acordo com sua escolha viverá em comunhão ou não,
seu nome poderá servir aos mais novos ou não,
a ação será teu testemunho,o tempo teu livro em branco,
agora salta, agora aceita tua sina, agora cala e segue.

24.11.08

Hai Kai

fiz tudo errado,
dia frio de primavera,
acordarei num mundo melhor?

20.11.08

D. Viola

Nossos passos rápidos acompanhavam a vontade que ainda muito mal podemos compreender. O dia quente, céu nublado, o balsamo vindo em forma de amigos e palavras, D. Maria puxou o carro na altura de seus 89 anos de idade, os restos humanos do vô, que foi chamado pra festa nove anos antes por ser bom tocador que era (bandolim e viola) não podia faltar na boa farra dos anjos de Baco. Enfim (fim?), antes de descer ali naquele buraco de terra, sua tão estimada viola - D.Maria - era necessário remanejar o vô para que ambos os corpos, caquinhos biológicos, pudessem ali ficar até a próxima descida, veio ele buscar sua estimada viola, cantoria de outrora que rendeu onze gestações. Oh! Seresta boa! É pena que hoje não temos mais dela.Mas voltando aos que ficam por aqui perambulando nesta terra de contas, faturas, diplomas e chantagens, estávamos lá, ainda a pouco estávamos lá, o sepulcro aberto, desce o coveiro (sorridente como qualquer trabalhador braçal que naquele dia não trabalharia embaixo do forte sol que insiste em nos lembrar de tudo que ignoramos), enquanto ele, o bom coveiro entre uma anedota e outra (bom psicólogo de prática mesmo) começava sua tarefa de tirar o vô dali, víamos a falanges das mãos, os dedos que tanta musica fizeram soar, sabe-se lá quantos beijos, olhares apaixonados e mimos doces não foram inspirados também pela melodia que do bandolim do vô ia direito pro coração dos jovens amantes. Foram os ossinhos para a caixa de alumínio, também observamos que enterraram o músico sem meias, com um pouco mais de trabalho foram também os ossos dos pés para a caixa reluzente, nossos olhos em certo momento pararam no crânio inclinado na terra, de terno escuro com as mãos cruzadas, um pouco de cabelo restava ali, enquanto nós, naquela cena tim-burtiana contemplávamos de certa forma atônitos o fim certo de todos os que ainda vivos, permanecem no teatro, imagino que os restos mortais recolhidos, também nos contemplavam de forma mais introspectiva digamos, mas permaneciam ali calados, olhando de dentro da cova, observando estes que ainda alimentam a ilusão de caminhar e carregar a bel prazer, ossos de um lado para o outro, como eram ossos mais experientes, eles guardaram silêncio e nos deixaram em paz com nossa ilusão de vida livre e morte cativa.Confesso que o que me chamou mais atenção depois da cena morbidamente bela daquele esqueleto envolto em restos de terno e renda, foi a retirada da clavícula e das costelas, frágeis alvos no caminho marcial (estudei-as), entre os comentários dignos dessa hora de exumação, o que se comenta?Comenta-se que seria melhor cremar, que fulano (outro vô conhecido) foi cremado, suas cinzas espalhadas entre um cafezal e uma praia, que cremação custa caro, que o vô buscou a vó conforme disse que buscaria, depois disso tudo paramos em silêncio, voltamos ao primeiro raciocínio, eis a afirmação cabal desta tarde cinza e quente de primavera:Ali nos encontraremos todos, todos. Agora o sabemos, no mais próximo da prática que podemos saber.Juro que se fosse mais insolente teria apontado o celular pro corpo do vô e teria tirado uma foto.Não só eu.

de mim mesmo e Naiara (comentários e revisão pós)

13.11.08

Novembro de 2008, chegamos até aqui.

A chuva cai do céu, cai também na minha alma, e cai por terra todos os pesares, antes disso no centro de um furacão que não envelhece, eu lá esperando a hora que nunca chega, chega.
meus gatos, partes soltas de mim mesmo, mostram prequiçosos o que trago comigo na mochila, um punhado de charme, três quilos de desejo, um pacote de revolta (que nunca é aberto), dois livros (um não lido), um violão e umas fotos antigas.
Sento e observo passivo (?) os fatos que sucedem em torno de mim, pego aqui e acolá umas responsabilidades, não piso em terreno que não é meu, embora queira por um instante, mas não o faço, aliados são raros, raríssimos.
Penso em escrever, uma carta, um blog, uma música, mas acabo mesmo é escrevendo na minha psique todo o medo do que há de vir, espero sobre tudo, sobre tudo espero, guardo em mim a paciência de quem me ensina sem querer me ensinar, e lá vou eu.